O termo “rito” não é uma inovação da cristandade, mas foi retomado pela Igreja e tem sido utilizado com toda sua riqueza e ambiguidade.
Rito e liturgia
O termo “rito” sempre teve um sentido religioso ligado à esfera litúrgica que permanece até nossos dias. Já a Vulgata fazia deste termo um sinônimo de cerimônia, de prescrições e de costumes ligados à liturgia.
Com o “rito”, a Igreja indicava no início a praxis de uma certa liturgia, como rito da aspersão da água ou o rito de acrescentar a água no vinho, na Santa Missa. Depois começa a indicar uma cerimônia de culto, quer dizer, toda a função litúrgica, como o rito do batismo e o rito da missa, por exemplo: ou inclusive indicava-se com o termo “rito” o próprio conjunto da liturgia, como o rito romano, ou o rito ambrosiamo em Milão [1].
Rito entre lei e disciplina
A finais do século XII, com Celestino III (1191- 1198), o termo “rito” foi usado para indicar o conjunto de leis ou de costumes que se devem respeitar e observar atentamente. Celestino III, de fato, aos bispos gregos que tentavam impor a observância de seus ritos e costumes ao clero latino, ele impedia de mesclar os diversos ritos.
Em seguida, o rito começou a indicar toda a comunidade que observa estas leis, disciplina e liturgia. Aparece, portanto, o sentido de “igreja particular”.
Rito e igreja particular
Desde o século XVII, começa-se a falar do rito Latino, do rito Armênio e do rito Grego. Aparece, portanto, este novo significado do termo “rito”, como igreja particular. A primeira codificação oriental seguia usando o termo “rito” em seus diversos significados, seguindo o código de 1917. Por exemplo, o Motu Proprio Cleri Sanctitati [2], de Pio XII, no can. 200, utiliza o termo “rito” no sentido de cerimônia litúrgica. O Motu Proprio Crebrae Allatae [3], em contrapartida, no can. 86 § 1. 2°, com o termo “rito” indica os fiéis que pertencem a uma igreja particular.
Do Vaticano II ao Código dos Cânones das Igrejas Orientais
O Concílio utiliza o termo “rito” de duas formas diferentes – ou para dizer melhor – de duas formas complementares [4]. Na primeira, o Concílio Vaticano II abre uma nova dimensão ao termo “rito”, dando-lhe uma nova definição. Na segunda forma, o Concílio utiliza o termo “rito” com o significado já recebido no passado.
Por uma parte, o decreto conciliar Orientalium Ecclesiarum [5], que é um decreto sobre as Igrejas Orientais, no número 3, dá uma definição bem precisa do termo “rito”: “Tais igrejas particulares, tanto do Oriente como do Ocidente, embora difiram parcialmente entre si em virtude dos ritos, isto é, pela liturgia, disciplina eclesiástica e património espiritual, são, todavia, de igual modo confiadas o governo pastoral do Pontífice Romano, que por instituição divina sucede ao bem-aventurado Pedro no primado sobre a Igreja universal” [6]. Observa-se, portanto, que com o termo “rito” indica-se o conjunto do patrimônio litúrgico, disciplinar e espiritual de uma igreja particular. Definindo assim o termo “rito”, o Concílio prolonga seu sentido recebido já desde o passado e lhe atribui um sentido canônico.
O Concílio Vaticano II segue utilizando o termo “rito” indicando também o conjunto dos atos litúrgicos ou a própria função, por exemplo, no número 71 de SC [7] utiliza a expressão “rito da Confirmação”; no número 19 de PO [8], “rito da Ordenação”, etc.
Por outro lado, o Concílio Vaticano II utiliza o termo “rito” como sinônimo de “igreja particular”. De fato, o decreto conciliar Orientalium Ecclesiarum, nos números 2, 3, 4 e também no título do parágrafo utiliza esta expressão: “As Igrejas Particulares ou os Ritos”. Para o Concílio Vaticano II, portanto, o termo “rito” é uma expressão com a qual se entende também a “igreja particular”.
Em seguida, o Codex Iuris Canonici [9] de 1983 simplifica a terminologia, dando um só e único sentido ao termo “igreja particular”. Como igreja particular, no Codex Iuris Canonici se entende só a diocese. Enquanto que com o termo “rito”, entendem-se as celebrações litúrgicas, como se afirma no can. 2.
Para as Igrejas orientais que estão em comunhão com Roma, o Codex Iuris Canonici, em diversos cânones, usa o termo “iglesia ritual sui iuris”. Observa-se também que o Codex Iuris Canonici segue utilizando o termo “rito” para indicar uma igreja oriental.
O Código dos Cânones das Igrejas Orientais, no can. 28 § 1, dá uma definição muito precisa da noção de “rito”: O rito é o patrimônio litúrgico, teológico, espiritual e disciplinar, diferente por cultura e circunstâncias históricas dos povos, que se expressa no modo de viver a fé que é próprio de cada Igreja sui iuris.
Observa-se deste cânon que o rito converte-se no patrimônio de um grupo. Este patrimônio não é comum, portanto, a todas as Igrejas orientais: cada uma tem o seu. O rito é um patrimônio que tem quatro elementos essenciais: litúrgico e teológico, espiritual e disciplinar. Este é depósito e totalidade de uma comunidade religiosa em seu conjunto.
A noção de “rito”, desta forma, recebe uma riqueza e clareza pela primeira vez na história da Igreja. Converte-se na maneira em que um povo vive sua própria fé.
O Codex Canonum Ecclesiarum Orientalium não fica sozinho em definir a noção de “rito”, ao contrário, para evitar qualquer ambiguidade, estabelece seu nascimento e origem:
28 § 2. Os ritos dos que se trata no Código são, a menos que não conste o contrário, os que têm origem nas tradições Alexandrina, Antioquena, Armênia, Caldeia e Constantinopolitana.
Cinco são as tradições, as matrizes, de todos os ritos. A tradição é a origem do rito. A própria tradições, inclusive, poderia ser a origem de vários ritos diferentes.
Concluindo, observa-se que no Codex Canonum Ecclesiarum Orientalium a noção de “rito” toma o sentido de patrimônio e com ela se expressa a maneira de um grupo viver sua própria fé em sua totalidade litúrgica, espiritual, cultural e disciplinar.
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1) Cfr. E. EID, Rite, Église de Droit Propre e Juridiction, en L’année canonique, 40 (1998), 7.
2) AAS, 49 (1957) 433- 600.
3) AAS, 41 (1949) 89- 117.
4) Cfr. E. EID, Rite, Église de Droit Propre e Juridiction, 9.
5) CONCILIUM OECUMENICUM VATICANUM II, Decretum de Ecclesiis Orientalibus Catholicis, Orientalium Ecclesiarum, (21.XII. 1964), in AAS, 57 (1965), 76- 89.
6) OE 3.
7) CONCILIUM OECUMENICUM VATICANUM II, Constitutio de Sacra Liturgia, Sacrosanctum Concilium, (4. XII. 1963), in AAS, 56 (1964) 97- 138.
8) CONCILIUM OECUMENICUM VATICANUM II, Decretum de Presbyterorum Ministerio et Vita, Presbyterorum Ordinis, (7. XII. 1965), in AAS, 58 (1966) 991- 1204.
9) I. PAULI II PP., Codex Iuris Canonici, in AAS, 75 (1983), pars II, 1– 317.
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